Ter ou ser

Ser ou não ter, ou ter e ser, eis a questão. Não se faz necessário ler três linhas de qualquer obra sociológica – ou algum escrito do sociólogo(?)Fernando Henrique Cardoso – e nem ocupar “Tico e Teco” em sua totalidade, para perceber que o capitalismo acirrou os ânimos entre os dois lobos que nos habitam. Diz o velho índio ao seu neto, que a vitória será daquele que for mais e melhor alimentado.

É notória a “pressão” para matarmos o SER de completa inanição, não supri-lo suficiente para reagir às vigorosas e contundentes investidas do TER. Logo cedinho um anúcio afirma que sua Smart TV LED 40″, Full HD, com Conversor Digital, 2 HDMI, 2 USB, Wi-Fi e o diabo a quatro, não serve mais para assistir o Neymar e os outros 10 coadjuvantes da seleção brasileira na Copa da Rússia, melhor mesmo é a LED 60″, Full HD, K4, com Conversor Digital, 2 HDMI, 2 USB Wi-Fi e o diabo a quatro; aquele Nike comprado ontem, também ficou obsoleto, já não lhe calça bem os pés, bom mesmo é o novo modelo com a logo da Copa; a camiseta da seleção da Copa do Penta, a qual você credita sorte, esqueça. Sorte mesmo, só com a “nova” do Tite; a surrada cueca de copinho, usada somente em dias de jogos do escrete de ouro, jogue-a fora, pois, a melhor mesmo é aquela marca que o Neymar costuma mostrar nas transmissões dos jogos, viu? Não basta SER torcedor, tem que TER produtos verde e amarelo. Difícil resistir, não?

O bombardeio é intenso, preciso e permanente contra o coitado e debilitado SER. Nesta seara muitos confundem TER com SER e vice versa.

Em um documentário sobre Nina Simone, onde com todo sucesso, cumprindo seu sonho – ou parte dele – de cantar no Carnegie Hall, em Nova Iorque, palco sagrado aos maiores, ela fala de sua frustração, pois diz TER se preparada para SER a primeira negra pianista clássica dos Estados Unidos a tocar ali, no entanto pisou como a maior cantora de jazz e blues: “Sim, estou no Carnegie Hall, finalmente, mas não estou tocando Bach”, disse, respondendo aos seus pais. Cada vez mais fico convicto que o TER e o SER, trilham diferentes rotas. O TER sucesso geralmente é depositado aos espaços que você galga, e até os números em sua conta bancária e, SER realizado só farta a alma e o coração.

Para um matuto, vindo lá do sertão de Angicos, dentro das devidas proporções, tive uma carreira profissional de sucesso, passei por todos os grandes veículos de comunicação do meu estado, fora dele e até com convites para outros países, de certa forma, me sentia realizado também, entretanto, parece que faltava algo, pôr a rolha, o carimbo. Ontem, recebi um pedido para fazer duas caricaturas que me comoveu. Valentina, uma bela criança de 10 anos, – prima de Maria -, juntamente com a amiga Lorrany, fazem o programa Conexão Kids na TV, no canal Brisanet (Tv cabo Mossoró, canal 172) com conteúdo gerados pelas duas e dentre outros cartunistas, me escolheram para tal empreitada.

Disse a mim a mesmo, que era isso que faltava para eu gritar aos quatro ventos SER um cartunista realizado, pois, se meu trabalho consegue atenção, respeito e admiração de crianças é porque certamente, valeu a pena e ainda podemos contrariar e combater o TER e, apenas, SERmos. São crianças assim, que SERão a diferença neste mundo do TER.

Ah! A foto acima é da minha neta Aléssia e seu desenho, que dá sinais de pisar nas pegadas do avô. Sim, sou cartunista!

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