Laércio Eugênio o “pagão”

Outro dia, numa postagem que fiz nas redes sociais, uma assídua amiga comentou que eu acordara saudosista. Aquilo me calou, não por ter me sentido ofendido ou algo que o valha, mas por conter a verdade nua e crua.

Naquela ocasião estava mesmo com uma saudade caninana, daquelas que a gente fica feliz da vida em sentir, mais feliz que pinto cisqueiro de reviver aqueles momentos que agora fazem parte de nosso baú de boas lembranças dos tempos de galos, noites e quintais, época de boemia jovialmente e despretensiosamente irresponsável.

Do alforje puxei umas cenas, entre milhares, uma quando eu Carlinhos, Jorge Braz, Laércio Eugênio, Hudson – certamente esqueci outros tantos, pois era uma corriola danada – íamos para o Djalma Bar, ainda lá nas cajaranas, creio que na sua casa, numa ruazinha, perto do Colégio Estadual, tomar cachaça com coração assado ouvindo Raimundo Fagner, Manera Fru Fru Manera, pois era o preferido de Jorge e que abria os “trabalhos”, claro Zé Ramalho presente no cardápio, depois de algumas dezenas de “burrinhos” discutíamos a política sindical, partidária e social, muitas das vezes varávamos madrugadas a dentro pra pegar o sol com a mão.

Também me veio à tona uma história de convite que chegou para inauguração de uma boate por detrás da Escola Padre Deon, no Alto de São Manoel. Numa sexta-feira alguém na redação do jornal Gazeta do Oeste diz do convite da Boate Estrela, este invadiu todo o prédio, logo começou as combinações: quem fosse terminado seus afazeres ia esperando os outros até estar completa a turma. Conferido, não faltando ninguém lá se foi o magote para “boiti”- Como dizia o saudoso Abel Rodrigues – In memoriam – o fotolitista do jornal -. Uma sexta-feira, no meio do mês já dizia do lastimável e precário momento em que se encontrava nossos “probrezitos” bolsos. Mas ora, quem anda com carteira de jornalista não passa “perrengues”. A solução foi “carteirada”, não lembro quem – se foi eu, também não digo -, um de nós iniciou a fila indiana na portaria:

– Isso é o quê? Perguntou o sisudo porteiro.

– Imprensa!!!

O porteiro espalmou uma mão com a carteira colocando a outra por cima pressionou, devolvendo falou: “pronto! Imprensei”, não se dando por rogado nosso “líder” argumentou:

– Somos da imprensa e convidados…

– Aqui até mamãe paga, imagine convidados da imprensa. Disse o porteiro com tom irônico.

Sem mais a quem ou a que apelar para “filar” passe-livre, nos reunimos para uma “vaquinha”, feita, nos dirigimos à bilheteria.

Já dentro boate as luzes negras fluorescentes denunciavam os casais nos cantos aos amassos, sarrando, mesas lotadas de gente e cervejas, dancing repleto de imagens se mexendo ao ritmo dos hits do momento e nós ali sem a menor esperança de um gole de coragem para entrar no relabucho. 

Salvos por Laércio Eugênio que chamou o garçom e disse para encangar várias mesas uma na outra, logo estávamos todos acomodados, de esperanças renovadas e, por que não dizer, concretizadas, pois ao mesmo tempo nosso “benfeitor” tinha também indagado se havia cerveja gelada, ao receber resposta positiva, falou: “pois, bote cerveja gelada aqui como quem bota milho pra jumento”, os olhos de alguns de nós saíram da caixa. 

Bebericando, comendo e dançando quando demos por nós o sol já descambava no horizonte, só tinha a gente e um monte de garçons prestando conta. Logo veio um em nossa direção, aqui senhor, Laércio Eugênio recebe a conta, retira do bolso uma quantia e entrega ao garçom:

– Senhor está faltando…

– Eu sei, mas tenho só isso…

– Como é?

– Eu não tenho mais dinheiro não…

– Mas foi você que disse que ia pagar a conta.

– Mas eu estou pagando!

– Não senhor, aqui não tem nem meus dez por cento…

– Mas é o que tenho, depois pago o resto.

O antes gentil garçom, saiu soltando fogo pelas ventas para falar com o dono. Olhando em volta já percebíamos garçons, seguranças, porteiros, cozinheiros, se dirigindo em nossa direção todos com caras de poucos amigos, quando de repente chega Abel – que trabalhava com a gente e também era garçom – dizendo que já tinha falando com o dono, estava todo certo, na segunda-feira ele iria no jornal receber nossa conta com juros e correções monetárias.

Brito e Silva – Cartunista

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