Pingo de Mei Dia
“Não troco meu oxente pelo Ok de ninguém”, frase do grande mestre, que não carece de apresentações, o dramaturgo paraibano Ariano Suassuna, que a formulou como uma espécie de desabafo e um apelo à reflexão a nós nordestinos e brasileiros no trato com nossa arte, cultura, língua e nossa identidade.
Ariano parece conclamando para que nós pudéssemos olhar um pouco mais para interior: tanto o pessoal como geográfico, nosso torrão, para vermos que são nos rincões, grotões, povoados de chão batido que a cultura, a identidade do povo nordestino borbulha: Pastoril, Boi de Reis, São João (com fogueiras), o cordel, os cantadores de viola, emergem sem o marketing, sem as redes sociais, sem os chamados “agitadores culturais”. Porém, na verdade muitas das vezes, ou quase sempre, puxadas por brincantes analfabetos que apenas queriam (querem), de algum modo, expor suas emoções, uma forma de extravasar, exorcizar suas angústias, suas dores da vida sofrida na labuta diária e, por uma fração temporal exibir um sorriso no rosto.
Ariano era intransigente na defesa da arte da aldeia, quer dizer, da cultura popular isto está refletido em suas obras: literatura, desenhos e em falas à imprensa, nisto todos concordam. Mas, existe aqueles que o acusam de radicalismo. Ora que seja. Se faz necessário mais empenho, mais valia na defesa da arte popular. Arte tem que ser generosa, não sufocante e sufocando outra.
Na minha época de menino e toda minha adolescência lá na rua Augusto da Escócia, nº 49, nos Paredões, em Moscow, a gente se reunia para ouvir Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Trio Mossoró, Trio Nordestino, além Chico, Caetano, Gil, Elizete Cardozo, Nelson Gonçalves Francisco José… Ouvi Apelo e Gente Humilde lá em casa numa radiola ABC – Elizabeth V -. A gente ouvia forró forró: sanfona, zabumba e triângulo, hoje chamado “forró pé de serra”, que aparentemente faz um esforço monumental para continuar existindo, ao contrário do chamado “forró de plástico” – cunhado, se não me falha a memória e ela quase sempre falha, por Chico César – onde há uma pressão estrutural e financeira se impondo para catapultá-lo às alturas em detrimento do forró tradicional.
Claro, que a humanidade evoluiu, continua seu fluxo e tudo faz parte do processo. Evoluímos em todas as áreas, isto não quer dizer que melhoramos, em algumas até pioramos, entretanto isto, é outra discussão. A impressão que dá é que o “Forró Pé de Serra” agoniza e tem seus dias contados. É preciso a valorização da nossa arte, nossas tradições, nossa identidade, claro sem radicalismo ou preconceitos. O grande Jackson do Pandeiro queria misturar chiclete com banana, mas depois que o Tio San tocasse tamborim, assim também como fez meu amigo Jaques Cassiano – um grande cartunista mossoroense, que para nossa frustração não quer mais desenhar – essa montagem com os “Garoto de Liverpool”, talvez saindo de uma entrevista ao amigo Togo, para o jornal De Fato e, indo relar o bucho no Pingo do Mei Dia, é preciso um pouco mais de ousadia de todos com a cultura regional.
Bom, mas quem quiser que fique com seu “plastificado”, prefiro um bom forró pé de serra: “Santo de barro, santo pequenino, desde menino…”. Viva o Nordeste, viva Mossoró, viva o Pingo de Mei Dia.
Brito e Silva – Cartunista
PS: Um show do cantor de forró Flávio José foi reduzido para ceder espaço para o sertanejo Gustavo Lima.