Harmonização facial
Que me perdoem os entendidos do “babado”, sou completamente ignorante do borogodó e, portanto, posso cometer algumas heresias por permanecer apenas na superfície, pode ser que diga bobagens, o que não seria alguma novidade. Percebo que o preenchimento facial fazia e, talvez ainda faça, a festa nas bocas e orifícios das celebridades midiáticas – profanadoras dos belos beiços de Angelina Jolie – entretanto, não sei se por erros de aplicação ou mesmo se o “aplicante” fez esforço desumano e no final o resultado não mostrou frustrante, pois sabia ser impossível obter outro que não fosse o desimbeiçamento, algo como receber uma esquerda do Mike Tyson sem o protetor da cavidade oral, ainda assim a “vítima” injetada, por ter ciência ou não, da “desarmonia” com que a natureza lhe deu nascituro, corre ao espelho numa selfie exibindo o seu, agora, fresado orifício bocal avolumado assemelhando-se às nádegas vermelhas de alguns primatas da Amazônia, quando estão na maturidade prontos para acasalar, para os seguidores das redes sociais.
Porém, a nova moda ao cenho da moçada é a tal da “harmonização facial”. Para alguns revela que não há dúvidas um upgrade, de fato, parece trazer um rejuvenescimento, meio plastificado é certo, a pessoa se mostra mais ou menos como era há alguns anos, logo, é válido. Porém, para aqueles seres com as quais a natureza não lhes foi muito benevolente o resultado não é o mesmo, quer dizer, na verdade é o mesmo, com os mesmos resultados lógicos, entretanto não contemplam o mesmo desejo: o bonito quer ficar mais bonito, em geral, acontece. O feio faz a harmonização buscando ficar bonito e, por força da natureza, acontece uma “desarmonização” conjuntural cósmica: a bonita volta ao passado parecendo mais jovem e mais bela, o feio avança ao futuro se revelando mais velho e muito mais desprovido de beleza.
O bom de se saber que é feio, é que vai viver assim para o resto de sua vida e, pode tornar o espelho apenas uma peça de consciência, esquecendo a nesta frase “espelho, espelho meu…”, pois, reconhece no espelho sua verdade. Lembro, que na adolescência quem me deu a consciência de ter sido preterido por Afrodite e que você podia fazer do limão uma limonada, foi um feio que nos anos 70, na Europa, fazia bonito no cinema e junto as mulheres, com outros astros bonitões do momento como Paul Newman, Alain Delon, porém, reza a lenda urbana nas margens do Sena quem “degustava muita gente”, quem se submetia a “ficante” das moçoilas francesas era o Jean-Paul Belmondo, titulado como “o feio mais bonito do cinema”.
Os escritores em suas escrivaninhas sob a luz difusa do abajur, quando são envoltos pela nevoa branca do luar penetrando pela fresta janela desvirgina a penumbra, criando um ambiente propício ao ócio criativo e assim se deixam levar por turbilhões de ideias inspiradas passam a escrever freneticamente suas obras primas, tomados por forças além da nossa exosfera, como a jovem escritora britânica Mary Shelley, que, certamente, numa dessas madrugadas de Londres – como imagino ter acontecido – nos brindou com o Frankenstein. Só não sei se ela podia prevê tanta imitação barata, hoje, sob as luzes de led nas salas de cirurgias, não pela pena, mas por bisturis sem fio e agulhas rombudas são produzidos alguns Frankenstein mal engendrados que passam a orbitarem, com abundância, as redes sociais perseguindo likes.
Semana passada quebrei um canino, joguei o problema odontológico para um futuro pertinho, pois muito bem. No dia seguinte, ainda, provavelmente aborrecido comigo, o lado direito do rosto amanheceu grosso, inchado, corri ao espelho, que coisa horrenda, parecia ter feito harmonização com Paulo Marchante, um amigo que esfola bode no seu terreiro, lá nos Teimosos, em Mossoró/RN. Evitando traumatizar meus netos, socorri-me de Pollyanne para me levar a uma urgência-odontológica.
Quem quiser que fique, que faça suas harmonizações. Fico com minha cara de cafuçu. Vai-te retro!!!
Brito e Silva – Cartunista