Encontro

Por um desses encontros que jamais seriam previstos em qualquer agenda — traçados apenas pelo acaso, com régua e compasso — todas as possibilidades e perspectivas pareciam conspirar para a impossibilidade de sua realização. Ontem, fui encontrar o amigo Pedro Tchê para uma prosa na praça de alimentação do Carrefour. Ao chegar, deparei-me com um carro estacionado e, no volante, uma senhora que ouvia uma música. Sem pedir licença, aquelas ondas sonoras invadiram meus ouvidos, despertando o empoeirado baú das memórias e me transportando permitindo um breve encontro a minha infância já tão distante.


Por alguns instantes preciosos, senti minha alma plena, leve como uma pluma, quase flutuando. As lentes dos meus óculos estavam molhadas, embora não chovesse.
Com nitidez, visualizei minha mãe, dona Geralda, diante da Vitrola ABC Voz de Ouro Isabela V. Vi-a colocar cuidadosamente o disco de Francisco José, ajustar o braço da vitrola e posicioná-lo na segunda faixa. O som do atrito da agulha com o vinil era tão familiar quanto o reflexo do meu próprio rosto no espelho. Sentei-me ali, naquela memória, e ouvi “Canção do Mar”. Logo, fui arrancado desse devaneio pelo toque de um celular. Era a senhora que se sentara ao meu lado, agora ouvindo Gustavo Lima, a realidade dói.


Ao sair, ainda pude ouvir, no carro da senhorinha, os versos de “Canção do Mar”, agora interpretada por Fafá de Belém e Ana Laíns. Ah, aquele instante – de tão breve alegria e tão eterno – certamente, me acompanhará para sempre.


Brito e Silva – Cartunista

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