Deus e o Diabo
Se não fosse o que sou: nada, certamente, seria psicólogo, filósofo, sociólogo, talvez. Não por entender alguma coisa desse borogodó. Porém, gosto dos dramas humanos, não que me trazem alguma satisfação sádica, mas para tentar entender porquê nós transformamos coisas banais em problemas indissolúveis, porquê de termos prazer em fazer uma enorme tempestade em um copo d’água, dramatizar um espirro ou um peido.
Começaria por mim. Sou um chorão, correm rios de lágrimas quando vejo e ouço meus netos da minha janela, vídeos, áudios e não poder abraça-los. Os olhos minam com Malhação; Programa do Ratinho; quando testemunho uma criança com fome; pelas mais 250 mil mortes da Covid-19 e no entanto, não costumo me martirizar muito pelo que fiz de errado, não por arrogância – talvez seja – se for, também o é por imaginar que somente eu naquela hora, naquele momento faria o que fiz com toda minha competência empenhada e se acaso me fosse permitido fazer ou refazer novamente hoje, certamente, não conseguiria nem mesmo usando toda minha competência, que poderia ser maior que antes. Logo carrego pouco fardo, e claro, o ato de se arrepender, lamentar e lamúrias seria um desperdício de energia. Se há alguma dívida, pago! E com minha consciência me entendo eu, se o “outro” eu permitir.
Pode parecer um pouco narcisista, egoísta e pouco cristão, mas em algum momento, quem não o foi? Meu bornal para rancores e dores pretéritas tem a profundidade de um pires: Não arrisco enlouquecer por vaidades tolas do “estar certo ou errado”. Se estou errado e se é para satisfazer o intransigente ou certo interlocutor, concordo e peço desculpas, se certo e, meu “erro” é a argamassa do argumento contrário, que fique com ele. Eu sei do que não sei.
Um amigo me confrontou capciosamente:
– Se fosse seu filho?
– Ora, certamente, não fui um bom pai e exemplo, se fui, ele não entendeu nada. De toda forma, em qualquer das hipóteses não posso pagar por seus erros.
Imediatamente lembrei-me de uma fala de César a seu filho Cômodos, no filme O Gladiador: “As suas faltas como filho são as minhas falhas como pai.” Definitivamente não sou e não seria esse pai. Tenho uma fé cega na justiça, portanto, se ao meu fardo faltam pecados, não recusarei minha justa pena. Não busco ter razão. Apenas creio na ideia de que todos possam ter direito, principalmente o trabalhador, de viver dignamente. Assim penso, assim tento viver. Entretanto, tenho ciência que a luta entre “deus e o diabo” não será finita.
Brito e Silva – Cartunista