Decifrando o trabalho de um… Caricaturista
26/07/16
Como é o trabalho de um caricaturista e chargista? Entrevistamos o grande José Brito e Silva, autor do Blog do Brito e responsável por ter assinado trabalhos em um sem-número de veículos de comunicação pelo país.
Ao hiveBlog ele conta sua história pessoal e detalhes sobre a profissão. Aprenda com as respostas inspiradas deste craque!
1- Qual sua formação?
Venho de uma cidade do interior do Rio Grande do Norte, Angicos, da região nordeste do Brasil, e um filho de camponês pensar em uma formação acadêmica era sonho mesmo, quase impossível nos anos 70, pois poucos conseguiam.
Primeiro, o homem do campo imaginava uma vida melhor nas cidades maiores e migrava, como fez meu pai que acabou indo para Mossoró (a segunda maior cidade do estado). A ação mais emergente ao chegar na cidade grande era a subsistência, depois se pensava em outras possibilidades para família. Porém, no ensino fundamental, nas aulas comecei meus primeiros rabiscos desenhando figuras para ilustrar os trabalhos de história e isto foi continuado no ensino médio.
A admiração por Picasso, Salvador Dali, Anita Malfatti e Cândido Portinari me levaria a ter cursado Belas Artes, porém, na minha cidade não existia.
“A admiração por Picasso, Salvador Dali, Anita Malfatti e Cândido Portinari me levaria a ter cursado Belas Artes”
2- Como é a reação das pessoas quando você conta sobre seu trabalho? Acham curioso?
Dentro do universo da comunicação e da arte não há esse tipo de questionamento. Logo que chegou a internet, criei um site www.blogdobrito.com onde passei a escrever e publicar charges e cartuns.
A reação foi imediata, porque passei a atingir outro tipo de público, mas aí começou umaenxurrada de pedidos para fazer desenhos e caricaturas gratuitas e isto foi potencializado com as redes sociais. Muitas pessoas não acreditam que desenhar é um trabalho como outro qualquer, que nós desenhamos por esporte e não como ofício, um trabalho…
“Muitas pessoas não acreditam que desenhar é um trabalho como outro qualquer”
Grace Jones, por José Brito e Silva
3- Você trabalhou 37 anos em meios de comunicação… é muita coisa! Onde você já publicou seus trabalhos e onde ainda gostaria de publicá-los?
Aqui, no meu estado, RN, trabalhei em quase todos os jornais e TVs. Em Mossoró, trabalhei no jornal Gazeta do Oeste, o Mossoroense e atualmente faço uma charge semanal para o Mossoró Hoje, o jornal de Fato mantém um link do www.blogdobrito.com e mais de uma dezenas de blogs reproduzem charges minhas.
Em Natal (RN) trabalhei no RN Econômico,(Revista); jornal Dois Pontos; jornal Salário Mínimo (jornal de esquerda); Jornal Estilo; O Povão(PE); publiquei uma ou duas charges no Pasquim (Rio de Janeiro); Novo Jornal e fiz charge animada para as Tvs Tropical (Rede Record) e Intertv Cabugi (Rede Globo).
Hoje, estou na bancada do programa Liberdade de Expressão, da TV União (Natal) semanalmente, onde faço comentários e veiculo uma charge animada.
No Final dos anos 80, fomos para Rio Branco (AC), no norte do país, eu e minha mulher Maria do Socorro, onde fui assumir a direção de arte e cenografia da TV e Jornal Rio Branco. Participei de várias exposições de artes e fiz algumas exposições individuais de caricaturas de políticos do Estado do Rio Grande do Norte.
Ah! Nos 80, eu, Laércio Eugênio e Jackson Cassiano criamos uma revista só de charges e cartuns– talvez a primeira do estado-, chamada Tabefe, dizem que está exposta no Museu de Arte Moderna do Japão.
Sinceramente não sei onde gostaria mais de publicar, talvez eu não me enquadraria nos grandes veículos de comunicação nacional. Não fico muito à vontade fora da minha zona de conforto que é meu escritório. Trabalho ouvindo a música que eu gosto e os sons da minha casa: Socorro conversando com as plantas dela, a voz de um neto, no viva voz, o som desafinado do meu violão, são hábitos que uma pessoa com mais de meio século de vida adquiriu e só vai somando a outros…Talvez trabalhar para o beBee.com…kkkkk 🎉
“Nos 80, eu, Laércio Eugênio e Jackson Cassiano criamos uma revista só de charges e cartuns”
4- A charge necessariamente tem que ter um ponto de comédia e atualidade ou não é bem assim?
Não! Porque charge não é humor. Ela tem que ser fundamentalmente crítica e caricata. Se couber uma pitada humor a mais cai muito bem, mas você não pode ou não deveria fazer uma charge com humor usando a imagem daquele menino sírio que apareceu morto numa praia turca, isto seria descontruir a essência da charge, da denúncia, do tapa na cara, a charge (carga do francês).
Muito embora charges, cartuns e caricaturas não se enquadrem no politicamente correto,é preciso saber dosar e não ultrapassar a linha tênue do respeito e da ética. E claro, para fazer uma boa charge você tem que está antenado com os assuntos mais importantes daquele momento.
Já o cartum é essencialmente atemporal e mais solto, proporciona mais liberdade exatamente por não possuir compromisso com o atualidade, mas com uma causa, um hábito, um comportamento.
“Charge não é humor. Ela tem que ser fundamentalmente crítica e caricata”
Menino Sírio, por José Brito e Silva
5- Sabemos que os veículos impressos estão passando por uma grande reestruturação. Qual é o impacto da era digital na carreira de um chargista? Para onde você vê que ela está caminhando?
Todos as vezes que há mudanças de grande monta, se cria um pânico, porque ninguém tem a certeza para onde se vai. Vi isto na mudança da tipografia para impressão offset, com a chegada do computador, e agora estamos vivenciando a era digital. Muitos jornais e revistas estão fechando ou migrando para a grande rede e com isso causando um frisson entre os profissionais.
Eu gosto do novo, do desafio do papel em branco. Logo que surgiu a mesa digital comprei uma, no segundo dia já estava desenhando nela. Tive que voltar a desenhar no papel para não perder minha identidade profissional, mas desenho no papel digitalizo e finalizo no Mac.
A carreira de chargista vai existir enquanto houver um veiculo de comunicação. Outro vi dia um robô japonês que desenhava, mas ele não tem o meu traço, não tem a minha imprevisibilidade. Para onde vai nossa profissão eu não sei. Mas, se estiver vivo, vou pra onde ela for.
“Outro vi dia um robô japonês que desenhava, mas ele não tem o meu traço, não tem a minha imprevisibilidade”
6- Quais são as características e habilidades que um profissional que trabalha com charges e caricaturas deve ter?
Bem, para fazer caricaturas saber desenhar é fundamental ao passo que, para ser um chargista não é necessário este atributo.Tínhamos aqui no Brasil, infelizmente nos deixou nesta dimensão, o maior exemplo: Millôr Fernandes, que era um genial chargista e desenhava horrivelmente, mas tinha ciência do seu tempo, dos conflitos e mazelas que afligem a humanidade e, isto, é primordial para um chargista.
“Millôr Fernandes desenhava horrivelmente, mas tinha ciência do seu tempo, dos conflitos e mazelas”
Brito é o autor da caricatura de capa desta entrevista, que retrata com perfeição o presidente e o CEO do beBee, Juan Imaz e Javier Cámara.
+BÔNUS!
“Escutar” o que este artista tem a dizer é um privilégio. Neste artigo do Producer você encontra novas perguntas e uma caricatura exclusiva para seguir conhecendo mais sobre ele;
A curiosa carreira de cartunista – com José Brito e Silva
Todos (ou quase todos) os usuários do beBee já conhecem José Brito e Silva, este grande cartunista que está dando o que falar com as caricaturas dos integrantes de nossa rede social. Ele começou retratando nosso presidente Juan Imaz e o CEO Javier Cámara e promete mais desenhos pela frente.
Ficamos curiosos para saber mais sobre sua profissão, e portanto trazemos aqui mais uma entrevista com um ilustre usuário do beBee. Quem sabe você não será o próximo?
Papa Francisco, por José Brito e Silva
Brito, que tipo de desenho você mais gosta de fazer?
Indiscutivelmente qualquer tipo que possa inserir umamensagem crítica do nosso tempo e, isso o cartum me possibilita. Quando você faz a caricatura de um político, de um empresário ou mesmo de um fato que tenha uma certa expressão na sociedade, ela vai carregada de críticas, as vezes positivas outras nem tanto.
Por exemplo: quando fiz as caricaturas de Juan e Javier foi uma forma de dizer: eu aprovo a estratégia usada por vocês, que é de ser eles mesmos os garotos propaganda do negócio, são eles os maiores vendedores do beBee, achei fantásticos. Então, me sinto bem a vontade desenhando cartuns e nem sempre sou tão bonzinho. kkkk, às vezes pego pesado com os políticos.
Houve um ponto de transição em que desenhar passou de um hobby para ser uma carreira?
Desde os bancos escolares já desenhava. Em 1979, fiz um concurso de desenho promovido pelo jornal Gazeta do Oeste, tirei o primeiro lugar e passei a fazer parte do departamento de arte do jornal. Meu sogro, Antônio Caetano, quando soube, disse que eu não conseguiria dar de comer a filha dele com isso kkkk, e foi falar com o dono do jornal, Canindé Queiroz (que era amigo dele), para que me deixasse por lá que ele mesmo pagaria o meu salário, o quê não foi necessário, pois Canindé afirmou que eu tinha talento.
Eu acreditei… Desde então, milito na área. Agora, sem dúvidas foi um transição brusca, saí de desenhos escolares para desenhar profissionalmente figuras que estavam fazendo história.