Café amargo
Por Socorro Oliveira
Nem sempre os olhos refletem a alma, com o tempo aprendemos a controlar os sentimentos, não deixar transparecer o que vem na mente no momento, assim como o corpo nem sempre demonstra as dores que se sente.Venha, sente, vamos bater um papo de alma, não se preocupe minha consciência é um baú de chaves secretas, enferrujadas por causa das intempéries da vida, tomemos um café, o meu é forte e amargo, – minha tia costuma dizer que de amargo já basta a vida – não se sinta constrangido de não gostar do sabor amargo, assim como o café temos nossas amarguras e frustações.Não se envergonhe de largar o fardo que te corcova, que te faz lagrimejar, eu também choro de vez enquanto, quando as barreiras criadas não suportam o desague, não gostou do café mesmo adoçado? Te faço um chá, sou boa anfitriã gosto de fazer a pessoa se sentir à vontade, como se estivesse no seu habitar.Sim, a vida está bem mais difícil. Porém, isso não lhe dá o direito de ser tão amargo, deixe isso para meu café, o sol lá fora parece não amenizar a frieza dentro de você, eu sei, não precisa me dizer, um espirito de luz falou que tudo passa, isso também vai passar.Quer almoçar comigo? Vou fazer uma torta, minha especialidade, todos gostam, ou fingem gostar, eles são como os pensamentos, uns agradáveis outros não, posso servir um suco de maracujá, acalma os nervos, dizem que nos faz dormir.Ontem, estives-te presente em meus pensamentos: lembrei-me de dias inocentes de nossa infância lá no bairro Alto da Conceição, em Mossoró, de quando corríamos descalços, eu só de calcinha e você meu irmão Eguismar, com suas traquinagens, às vezes tirava o calção e saía nu com ele na cabeça, lembra? A calçada era nosso parque, as brincadeiras nos deixavam cansados sem pensar na vida que iriamos ter, só vivíamos e assim adormecíamos felizes.Precisamos nos ver com frequência. Um pouco mais de café?